Verdade amarga sobre o açúcar

A AMARGA VERDADE

SOBRE O AÇÚCAR 


(E OS ADUÇANTES)


Não é segredo que milhões de pessoas têm um vício grave. Eis como cortar nos doces de uma vez por todas. 


Karen Robock 



Provavelmente tem consciência de que a sua bebida de café espumosa ou o scone da pastelaria estão carregados de açúcar. Mas sabe que há espantosas quantidades de açúcar escondidas nos cereais de pequeno-almoço, nas alternativas vegetais do leite e até no frango frito que leva para casa?


«Os americanos estão simplesmente a consumir demasiado açúcar», diz Frank Hu, professor de Nutrição na Faculdade de Saúde Pública T. H. Chan de Harvard. A maioria das pessoas consome três vezes mais do que a dose diária recomendada de açúcar. E não é apenas um hábito inofensivo.


«A investigação tem sido bastante consistente, e as conclusões muito convincentes, de que comer demasiado açúcar pode levar a uma vasta gama de efeitos adversos na saúde», afirma Hu.


Mesmo que já tenha percebido a mensagem de que demasiado açúcar faz mal à saúde e esteja a dar passos para o reduzir, como ingerir produtos de pastelaria com «pouco açúcar» e refrigerantes com adoçantes, ainda não resolveu o problema – e pode estar a criar um novo.


Desde a década de 1990 que o aspartame é usado como substituto do açúcar em produtos como bebidas de «dieta», iogurtes e cereais de pequeno-almoço. Mas este adoçante é mais escrutinado desde um comunicado de julho de 2023 da Agência Internacional de Investigação do Cancro, uma divisão da Organização Mundial de Saúde (OMS), que classificou oficialmente o aspartame como «possivelmente carcinogénico para os humanos».


Então, qual a resposta? Em última análise, precisamos de repensar a nossa relação com os doces.


O PROBLEMA COM O AÇÚCAR


Na maior parte dos casos, os açúcares que estão naturalmente presentes numa maçã, numa batata-doce ou num copo de leite não são um problema. É o açúcar adicionado durante o fabrico de um molho para massa em frasco ou na preparação de um queque, ou quando se dissolve uma colher de açúcar no café, por exemplo, que prejudica a saúde.


Quando come ou bebe algo com açúcar adicionado o seu corpo decompõe-no através da saliva e depois a glucose é absorvida pela corrente sanguínea, aumentando o nível de açúcar no sangue, e desencadeia a libertação de insulina pelo pâncreas. Por outro lado, quando mastiga uma taça de bagas frescas, a fruta inteira contém fibras e outros compostos que diminuem a rapidez com que o açúcar é digerido, pelo que a glicose no sangue não sobe do mesmo modo.


Provavelmente já se apercebeu de alguns efeitos secundários imediatos e desagradáveis do excesso de açúcar adicionado, que podem ir desde dores de cabeça a névoa cerebral, mas que também afetam a saúde a longo prazo. Foi demonstrado que o excesso de açúcar adicionado tem um enorme efeito negativo na saúde do coração, diz Brooke Aggarwal, professora assistente de Ciências Médicas na Divisão de Cardiologia do Centro Médico Irving da Universidade de Colúmbia, em Nova Iorque.


«Pode promover a inflamação, que causa stress nos vasos sanguíneos e no próprio coração», afirma. Outros efeitos incluem o aumento de peso, a obesidade, a doença do fígado gordo, as cáries dentárias e até alguns cancros. Uma grande análise recentemente publicada no British Medical Journal encontrou 45 efeitos negativos na saúde do açúcar adicionado, incluindo asma e depressão. 


É por isso que as diretrizes dietéticas dos Estados Unidos sugerem que se limitem as calorias provenientes do açúcar adicionado a menos de 10% do consumo calórico total por dia. E a Associação Americana do Coração recomenda que não se consuma mais do que 6 colheres de chá (25 gramas) de açúcar por dia para as mulheres e 9 colheres de chá (38 gramas) para os homens. Para referência, isso equivale aproximadamente a uma bolacha de chocolate e um iogurte magro.


Este baixo limiar é um choque para muitos americanos. «Falo com adultos à beira de doenças relacionadas com o estilo de vida, como a diabetes ou as doenças cardiovasculares, que nunca foram ensinados a ler um rótulo de informação nutricional», afirma Nicole Avena, professora assistente de Neurociências na Faculdade Icahn de Medicina em Mount Sinai, em Nova Iorque, autora de Sugarless e especialista em dependência do açúcar. «Muitas pessoas simplesmente não sabem quantos açúcares escondidos consomem ao longo do dia.» E depois, quando lhes dizem que precisam de reduzir o consumo, acrescenta, não sabem como começar.


OS SUBSTITUTOS NÃO SÃO A SOLUÇÃO


Num esforço para continuar a comer os alimentos de que gostam, evitando o excesso de açúcar, muitos americanos passaram a usar adoçantes alternativos e os chamados «açúcares naturais». O xarope de ácer, o açúcar de coco e o mel podem ter o efeito de aura de alimento saudável, mas na realidade não são melhores para nós. «É verdade que contêm alguns minerais e vitaminas, mas não são muito diferentes do açúcar refinado e também devem ser consumidos com moderação», afirma o professor Hu.


Os edulcorantes costumavam ser recomendados para as pessoas que tentavam perder ou manter o peso, mas também essa prática foi recentemente objeto de escrutínio. Na primavera passada, na sequência de uma análise sistemática, a OMS desaconselhou os adoçantes artificiais no plano de perda de peso, uma vez que não se verificou que reduzem a gordura corporal a longo prazo.


«Os dados sugerem que o consumo destes produtos tem pouco impacto na epidemia de obesidade», afirma Linda Van Horn, professora emérita de Medicina Preventiva na Faculdade de Medicina Feinberg da Northwestern University. O consumo de adoçantes pode até levar-nos a comer mais.


Os adoçantes são indicados para as pessoas que têm certos problemas de saúde, como a diabetes, refere o professor Frank Hu. E a Food and Drug Administration norte-americana afirma que o aspartame é seguro quando consumido na dose diária aceitável (DDA) de 50 miligramas por quilograma de peso corporal por dia. Para se ter uma ideia, uma pessoa que pesa 70 quilos teria de beber mais de 17 latas de refrigerante de dieta num dia para exceder esse limite. Mesmo assim, muitos especialistas em saúde e nutrição recomendam cautela. 


Outros edulcorantes, como a sucralose, também podem ser problemáticos. Investigações anteriores associaram-nos à tensão arterial elevada e a doenças cardiovasculares. Além disso, não sabemos quais serão os efeitos a longo prazo de quaisquer adoçantes artificiais nas crianças, diz Frank Hu.


Além dos possíveis efeitos na saúde, o outro problema dos alimentos adoçados artificialmente é o facto de não mitigarem o gosto por doces. «Como sociedade, o nosso paladar foi treinado para querer doces, para atingir esse ponto de felicidade em todas as refeições», explica Stephanie McBurnett, dietista registada e educadora nutricional do Comité de Médicos para a Medicina Responsável. «Essa é uma grande parte do nosso problema.»


PORQUE COME MAIS AÇÚCAR DO QUE PENSA


«Se tem um sabor doce, é porque tem açúcar», diz a Dra. McBurnett. Ou contém um adoçante. A peça mais complicada do puzzle é que, mesmo que algo não tenha um sabor doce, pode conter adoçantes. E se vier de um café ou de um restaurante de fast-food, ou se tiver um rótulo, é provável que contenha algum tipo de açúcar, como sacarose, xarope de arroz integral ou xarope de milho com elevado teor de frutose.


«O açúcar é adicionado para disfarçar o sabor desagradável de outros ingredientes, como os corantes e os conservantes», explica a professora Nicole Avena. O açúcar também pode ser adicionado para prolongar o prazo de validade e melhorar a textura dos alimentos processados, como a manteiga de amendoim e os pães de hambúrguer, afirma. É por isso que se encontra em tantos alimentos processados salgados que não consideramos inerentemente doces.


SERÁ QUE VAMOS COMER MENOS AÇÚCAR ADICIONADO SE FOR MAIS CARO?


Outra coisa em que o açúcar está escondido à vista de todos é nas bebidas, incluindo sumos, refrigerantes e batidos. «As bebidas açucaradas são 

responsáveis por quase metade do açúcar adicionado na dieta dos EUA», revela Frank Hu. 


Mais de 40 países e cidades em todo o mundo, incluindo a Finlândia, França e várias cidades dos Estados Unidos, introduziram um imposto sobre as bebidas açucaradas para desencorajar as pessoas de as comprarem. Até agora, parece resultar: um novo estudo publicado no JAMA Health Forum revelou que as vendas de bebidas açucaradas em cinco cidades (Boulder, Colorado; Oakland, Califórnia; Filadélfia, São Francisco e Seattle) diminuíram 33% depois de terem implementado um «imposto sobre os refrigerantes». A Academia Americana de Pediatria, a Associação Americana do Coração, a OMS e outras agências apelaram a um imposto nacional. Como é natural, a Associação Americana de Bebidas opõe-se.


Alguns especialistas defendem uma abordagem mais alargada, incluindo impostos mais elevados sobre todos os produtos com açúcares adicionados, programas educativos, limites à publicidade para crianças e uma melhor rotulagem dos produtos. «Tudo o que pudermos fazer do ponto de vista da saúde pública é positivo», diz Brooke Aggarwal.


ABANDONAR O HÁBITO DE VEZ


Em última análise, todos precisamos de reavaliar por completo o teor de açúcar em tudo o que consumimos. «O que defendo é fazer pequenas mudanças no comportamento e reduzir sistematicamente a quantidade de açúcar na dieta», diz Nicole Avena. 


Fazer isto lentamente, ao longo do tempo, é a melhor abordagem para evitar os sintomas de abstinência, que são muito reais. «O açúcar foi comparado à cocaína em alguns estudos», diz a especialista. «E as pessoas com “ressaca” podem sentir dores de cabeça, náuseas, irritabilidade, ansiedade e desejos intensos.» 


A boa notícia é que quaisquer efeitos secundários desaparecem ao fim de alguns dias e, ao cabo de algumas semanas, as papilas gustativas da pessoa voltarão a ser mais sensíveis aos sabores doces. Isto significa que não precisará de adicionar tanto açúcar ao chá, por exemplo, para sentir um toque de doçura.


Siga estas dicas aprovadas por especialistas para entrar no caminho certo:


• Evite os alimentos processados.

A investigação sobre alimentos ultraprocessados associou tudo, desde cachorros-quentes, queques, batatas fritas e entradas congeladas, a resultados negativos para a saúde, como a demência e doenças cardíacas e até a morte prematura. «Evitar os alimentos processados e escolher alimentos à base de plantas, juntamente com carnes magras, aves, peixe, marisco, frutos secos e produtos lácteos pode reduzir o risco de obesidade e doenças crónicas, melhorando simultaneamente a qualidade nutricional e o estado de saúde», afirma Van Horn. Os alimentos ultraprocessados tendem a incluir dez ou mais ingredientes, muitas vezes alguns que não consegue encontrar na sua cozinha e com nomes que pode não reconhecer. Em vez disso, opte por alimentos naturais que pode preparar em casa. 


• NÃO subestime o poder de uma troca inteligente.

Pode substituir o açúcar em muitas receitas de pastelaria por puré de banana ou molho de maçã, trocar o molho de salada engarrafado comprado numa loja por uma versão caseira e optar por água com gás com uma rodela de limão em vez de uma limonada engarrafada adoçada com açúcar, por exemplo. Se for criativo, as opções são infinitas. 


• Leia os rótulos dos alimentos.

É importante ler as listas de ingredientes e estar atento aos sinónimos frequentemente utilizados quando está a examinar uma embalagem de barras energéticas ou de cereais de pequeno-almoço. «Há mais de cinquenta nomes para o açúcar – e depois há os adoçantes», refere McBurnett. «Pode tornar-se muito confuso.» 


Regra geral, se for um ingrediente que termina em ose, é açúcar. E quando estiver a analisar o rótulo de informação nutricional, um valor diário (DV) de açúcar adicionado igual ou inferior a 5% é considerado uma fonte baixa de açúcares adicionados, enquanto um DV de 20% ou mais é elevado. 

Outra dica: não se esqueça de ler todo o rótulo. Alguns produtos combinam açúcares normais e substitutos, e um adoçante artificial perto do fim da lista de ingredientes pode passar despercebido. 


• NÃO evite tudo o que é doce.

Os açúcares naturais presentes no leite, na fruta e nos legumes, como a batata-doce e a cenoura, são nutritivos e contribuem para uma dieta equilibrada. 


«Faço questão de não demonizar o açúcar em geral», diz a Dra. McBurnett. 

Tudo isto não significa que deve jurar nunca mais saborear uma fatia de bolo de aniversário ou uma bebida gelada no cinema. O objetivo não tem de ser privar-se de açúcar. 


«Talvez queira apenas chegar a um ponto em que sinta que está num nível de consumo confortável – como se assumisse o controlo», afirma a professora Nicole Avena. 


Com o tempo, consumir menos açúcar adicionado e substitutos do açúcar vai tornar a sua vida muito mais doce. 



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