RESTAURANTE

«QUANDO ABRIR UM RESTAURANTE, SERÁ EM PORTUGAL.»


Eleito Chef do Ano na Alemanha, Áustria e Suíça


Mário Costa

fotografias de Miguel Marques




«A paixão pela cozinha começou por influência dos meus dois avós, um deles já não está entre nós, infelizmente, mas com ele aprendi muito sobre a confeção de arroz ou de bacalhau e muitos outros pratos. Com o meu outro avô, pai do meu pai, aprendi muito sobre os assados que ele fazia ao domingo, o cozido à portuguesa, as batatas a murro com polvo grelhado, e eu acompanhava isso tudo. E foi a partir daí que começou a crescer este bichinho, de tal maneira que aos 15 anos decidi ir estudar para a Escola de Hotelaria e Turismo do Douro-Lamego.»

A frase é de Miguel Marques, 26 anos, chef de cozinha, que foi eleito no final do ano passado «Koch des Jahres» («Chef do Ano»), que distingue as novas promessas da gastronomia na Alemanha, Suíça e Áustria. O jovem de 26 anos era, à data, sous-chef no restaurante Alois by Dallmayr Fine Dining, em Munique, e conseguiu convencer o júri da prova com as suas propostas gastronómicas. Além do galardão, também foi contemplado com 5000 euros em dinheiro. Mas esta não é a primeira distinção de Miguel Marques, que já ganhou outros prémios, como o concurso A Revolta do Bacalhau, em 2019. Formado na Escola de Hotelaria e Turismo do Douro-Lamego, iniciou o seu percurso gastronómico no restaurante The Yeatman, em Vila Nova de Gaia. Adquiriu depois experiência noutros espaços, como o Vila Joya, em Albufeira, e o Widder, em Zurique. 


O concurso que venceu, e que teve uma enorme repercussão nas notícias, é extremamente exigente. São cinco meses de preparação intensa para depois ser colocado à prova durante cinco extenuantes horas, e sob o olhar cirúrgico de uma fileira de chefs de renome mundial, todos eles com estrelas Michelin no curriculum. «São-nos dados previamente desafios para termos oportunidade de experimentar, treinar e testar o que queremos fazer. Depois, no concurso propriamente dito, temos cinco horas e vinte minutos de prova. Os últimos vinte minutos são para empratar e servir os pratos, e ao mesmo tempo apresentá-los ao painel de júris composto por dez chefs que, juntos, somam 25 estrelas Michelin!


É impressionante. E acho que aquilo que fez a grande diferença foi ter apresentado um menu com muita cor, com muito sabor, a jogar com os paladares todos da língua, desde a acidez, a doçura, o salgado, a gordura, foi diferente. Na entrada apresentei dois pratos lado a lado, com uma influência espanhola, que foi um croquete líquido com bechamel e um taco com caranguejo. Depois, no prato principal acertei no ponto da carne, que se calhar os outros colegas não conseguiram tanto, e acabei com uma sobremesa de ameixa com café, muito fresca, muito bonita, e acho que foi isso que fez a diferença», explica. 


Obter o título de Chef do Ano é uma distinção única, difícil de concretizar no exigente mundo da alta gastronomia. Mas coloca o jovem chef português debaixo dos holofotes da gastronomia europeia. Naturalmente feliz, Miguel Marques diz que é o resultado de muito trabalho e empenho. «Este prémio significa muito para mim. Significa o culminar de muito trabalho e empenho. Trabalho há cerca de dez anos nesta área, e é o ponto mais alto da minha carreira. E foi o resultado de muito trabalho e treino para este concurso, que decorreu entre maio e novembro do ano passado», diz durante a nossa conversa. 


Com 26 anos, mas já com anos de intensa atividade profissional, Miguel Marques iniciou-se nestas lides na Escola de Hotelaria e Turismo do Douro-Lamego. Ali aprendeu as bases da profissão, tendo depois aproveitado os estágios para dar nas vistas e começar a trabalhar como profissional. «A minha carreira começou com o primeiro estágio no Hotel Monte Prado, em Melgaço. Foi um estágio importante para conhecer esta área, para tomar contacto com a profissão, na altura só fazia oito horas por dia. Depois fiz um segundo estágio, muito importante para mim, no The Yeatman, em Vila Nova de Gaia, antes de terminar o curso. No final do estágio, regressei à escola para terminar o curso e, quando terminei, fui contratado pelo chef Ricardo Costa para regressar ao The Yeatman, e aí comecei verdadeiramente a minha carreira», recorda Miguel Marques. 

Ambicioso e sempre com o desejo de aprender mais e fazer melhor, Miguel Marques diz que foi na Suíça onde aprendeu mais sobre alta cozinha, mas não esquece os primeiros chefs com quem trabalhou. «Estive em Zurique, na Suíça, cerca de dois anos e meio, e foi onde aprendi mais, sem esquecer o que aprendi com o chef Dieter Koschina no Vila Joya, no Algarve, ou o chef Ricardo Costa no The Yeatman, em Vila Nova de Gaia. Mas onde aprendi mais sobre cozinha francesa, molhos, aquilo que importa realmente num prato, foi na Suíça», revela à nossa revista. 

Embora trabalhe habitualmente para uma clientela cosmopolita e com grande poder de compra, para quem produz iguarias intemporais e contemporâneas, o jovem chef português admite que, embora a sua cozinha seja de caráter internacional, tem um sabor português: «Posso dizer que a minha cozinha é internacional, mas sem esquecer que um bom molho começa sempre com um estrugido, um refogadozinho. Tinha no meu menu, por exemplo, tamboril, bulhão pato e mexilhões, e faço o normal bulhão pato, junto um escabeche, e é um prato português e tenho muito orgulho em apresentá-lo aos meus clientes. Nós vamos muito à sala apresentar os molhos, os pratos. E as pessoas perguntavam o que é o bulhão pato, e eu explicava que é uma arte portuguesa de confecionar mariscos, neste caso bivalves, e as pessoas ficavam muito contentes e adoravam o prato», revela à nossa revista. 


A viver fora do país há quatro anos, Miguel Marques tem a ambição e o sonho de ir mais longe, de agarrar novos desafios e novos projetos, que podem passar por ter um restaurante em nome próprio. Para já não passa de uma possibilidade. Mas tem uma certeza, será por certo em Portugal. «Será certamente em Portugal, sem dúvida. É a minha terra, tenho muitas saudades, já são quatro anos a viver fora do país. Aprendi muito, devo muito a estas experiências no estrangeiro, abriu-me muitas coisas, mas em Portugal tenho tudo, desde mar, peixe, carnes, queijos e tudo o que é bom para continuar a trabalhar.» 



No entanto, devido à ambição de aprender ainda mais sobre gastronomia e processos de confeção, Miguel Marques admite ficar mais algum tempo fora do país caso surja a oportunidade certa. E pode passar por países nórdicos. «Aquilo que me falta são os nórdicos, gostava de experimentar a cozinha nórdica. Desejo conhecer alguns restaurantes, que tenho na minha lista, porque gostava de saber a forma como eles pensam e trabalham com o pouco que têm. A maneira como preservam os produtos, com o foco no produto e nos molhos, por exemplo. Gostava muito de conhecer essa realidade.» 


Após cinco duros meses de preparação, Miguel Marques foi considerado Chef do Ano na Alemanha, Suíça e Áustria, numa prova que durou mais de cinco horas.


Miguel Marques apresentou um menu colorido que jogou com os paladares, equilibrando acidez, doçura, salgado e gordura. 


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