Supere a Dor

SUPERE A DOR




OS REMÉDIOS E ESTRATÉGIAS QUE PODEM AJUDAR A APRECIAR DE NOVO A VIDA



 Lisa Bendall 

Com reportagem adicional de Susannah Hickling



Desde a adolescência que Antony Chuter lidava com um grande desconforto devido a pedras nos rins recorrentes, acrescidas, em adulto, com problemas provocados pela ciática e uma doença dos tecidos conjuntivos que lhe afetava os pés, ombros e cotovelos. 


A viver no Reino Unido, o antigo engenheiro de TI agora com 51 anos, de Uckfield, no East Sussex, estava acostumado a viver com a dor. No início de 1990, ele e a sua companheira de então renovavam casas, iam velejar e saíam à noite. «Tínhamos uma vida ativa e ocupada», diz. Mas gradualmente a dor acabou por se sobrepor. Antony começou a cancelar compromissos sociais e acabou por perder o emprego, a casa e o relacionamento. Caiu numa depressão. 


Em 1995, o médico recomendou-lhe uma clínica especializada em dor, mas o verdadeiro ponto de viragem deu-se quase uma década depois, quando participou num programa de seis semanas que incluía um curso de gestão da dor liderado por pares. «Aquilo mudou tudo», confessa. «Aprendi a importância de viver para o presente e de encontrar prazer naquilo que consigo fazer.» 


Para obter alívio também faz alguns exercícios leves, como caminhar dentro de água e exercícios simples no ginásio. E quando sente um surto de dor, ouve música e joga no telemóvel. «Isso ajuda-me a descontrair», refere. 


O relaxamento é apenas um dos vários métodos de que dispõe para se manter saudável e feliz. Agora tem outra companheira e uma casa confortável. E dedicou-se a ajudar os outros a lidarem com a dor prolongada organizando um grupo de apoio de homens que se encontram duas vezes por semana via Zoom. «Ouvimo-nos uns aos outros», confessa. «A única regra é que falamos de como nos sentimos no momento. É muito catártico.» 


Pelo menos um em cada cinco europeus vive com dor crónica – definida como dor persistente que dura mais do que três meses – e metade diz que interfere com a sua vida profissional. Mas há maneiras de evitar que a dor crónica nos incapacite. 


E as boas notícias são que algumas das soluções também resultam para qualquer pessoa que sofra de episódios ocasionais de dor aguda, como dor de cabeça, de dentes ou muscular. 


Aqui ficam alguns métodos para controlar a dor, quer seja crónica ou aguda. 




TRATAMENTOS MÉDICOS 


Alívio tópico 


Para problemas de dor à superfície da pele – como artrite no dedo do pé ou uma lesão num nervo na ponta do dedo –, as pomadas ou géis medicamentosos podem proporcionar algum alívio. Normalmente contêm um anestésico tópico ou um composto anti-inflamatório não esteroide (AINE). 


As compressas, quentes ou frias, podem aliviar a dor musculoesquelética mais profunda, mas «deve-se evitar o contacto direto com a pele», avisa o Dr. Bart Morlion, diretor do Centro Leuven de Algologia e Gestão da Dor dos Hospitais Universitários de Lovaina, na Bélgica. «Coloque a compressa quente ou fria numa toalha. A aplicação de frio ou calor durante um período de tempo prolongado pode danificar os tecidos, por isso aconselho três vezes ao dia durante quinze minutos.» 


Medicamentos sem prescrição 


A aspirina, também conhecida como ácido acetilsalicílico (AAS), está no mercado desde 1899 e foi o analgésico mais popular do mundo em meados do século xx. O paracetamol, também conhecido como acetaminofeno, ficou disponível em 1950, e hoje figura entre os medicamentos mais usados. Ambos atuam mudando a mensagem dos transmissores químicos que viajam pela espinal medula e dizem ao cérebro que temos dor. 

Como têm os efeitos secundários menos nocivos de todos os analgésicos e podem ajudam a gerir vários tipos de dor, é melhor experimentá-los antes de escolher algo mais forte – a menos que o médico aconselhe a evitar estes produtos devido a alguma condição médica, como doença do fígado.


O Ibuprofeno, que é um AINE, quimicamente é como a aspirina mas tem riscos mais sérios, incluindo lesões nos rins e hemorragias gastrointestinais. Deve falar com o seu médico antes de o tomar, em particular se tiver mais de 65 anos ou problemas de saúde como diabetes ou hipertensão. 


Tenha cuidado com os produtos combinados, como os que contêm paracetamol e codeína. Quanto mais ingredientes um medicamento tiver, maior o risco de interagir com outro que esteja a tomar. «Se toma alguma medicação, fale com o seu farmacêutico ou o médico, ou ambos, e leia a bula do medicamento», sugere o Dr. Morlion. 


Medicamentos com prescrição 


Para a dor aguda também há AINE em fórmulas que exigem prescrição médica. (Há quem precise delas para aliviar a artrose, por exemplo, um problema que afeta mais de 40 milhões de pessoas na Europa.) 


E também há medicamentos de prescrição estritamente controlada para a dor crónica, incluindo os opiodes. Tenha presente que os tratamentos são diferentes consoante o tipo de dor. Por exemplo, a gabapentina e a pregabalina, medicamentos anticonvulsão, são frequentemente prescritos para dores que têm origem em lesões no sistema nervoso – como um nervo cortado ou zona. 



Injeções nas costas e nas articulações 


Os bloqueadores do nervo espinal – injeções de um anestésico de efeito prolongado nas articulações vertebrais – podem ajudar em alguns tipos de dores nas costas. Mas, tal como muitos outros tratamentos, a sua eficácia depende da origem da dor. Não aliviam a dor das hérnias discais, por exemplo, mas podem ajudar no caso de dores nas articulações interapofisárias, que ligam as vértebras. 

Em alguns pacientes com dor de cabeça crónica que não responde a outros tratamentos, o Dr. Morlion usa injeções de bloqueadores nervosos em zonas próximas da cabeça. Outra opção é a toxina botulinum, conhecida como Botox – também pode prevenir as enxaquecas ao bloquear a transmissão dos sinais de dor. As injeções de esteroides nas articulações inflamadas por vezes ajudam na dor artrítica. 

Todos estes tratamentos apenas permitem um alívio temporário à maior parte das pessoas, durando apenas entre semanas e meses, por isso precisam de ser repetidos. 


Estimulação dos nervos 


A neuroestimulação medular (NEM), que está a tornar-se popular por todo o mundo, pode anular os sinais de dor enviando impulsos elétricos para a espinal medula através de elétrodos implantados cirurgicamente. Não resulta com todas as dores, mas pode ajudar alguns tipos de dores nas costas e nos membros. Contudo, há riscos neste tipo de procedimento invasivo – uma bateria implantada pode ter uma fuga ou desenvolver-se uma infeção. Mesmo que resultem perfeitamente, estes dispositivos não duram para sempre. 


Há também uma forma nova, mais precisa, de estimulação, conhecida como GRD (gânglio da raiz dorsal, um aglomerado de neurónios situado na espinha média), que é administrada diretamente no aglomerado da raiz dos nervos. 


Uma opção menos invasiva, a neuroestimulação elétrica transcutânea (TENS), consiste na administração de uma corrente de baixa voltagem através da pele. Os dispositivos TENS são vendidos comummente para uso caseiro ou no consultório de um profissional de saúde. Alguns estudos sugerem que os TENS podem reduzir a sensação de dor nos casos de tendinite do ombro ou dor lombar porque interferem com os sinais dos nervos. No entanto, deve consultar sempre o médico antes de usar estes aparelhos, em particular se tem um pacemaker ou doenças como epilepsia ou trombose venosa profunda. 



INTERVENÇÕES NÃO MÉDICAS



Terapia cognitivo-comportamental (TCC) 


Como a dor é muito desagradável, o seu impacto emocional pode ser tão perturbador quanto a sensação física. As estratégias que trabalham o controlo a esta resposta – sendo a TCC a principal – podem melhorar o modo como nos sentimos, explica a psicóloga clínica britânica Sue Webb, que dirige um curso on-line com o objetivo de ajudar as pessoas a dominarem a dor crónica. «Reduzir a resposta emocional da dor é como baixar-lhe o volume», diz. «A TCC ajuda as pessoas a compreenderem o que está a acontecer-lhes e dá-lhes ferramentas para lidarem com o problema.» 

Por exemplo, ter consciência da sua conversa interior negativa pode ser uma ajuda. Está demonstrado que o stress e a ansiedade pioram a dor física, por isso, em vez de se censurar por apenas conseguir limpar metade do chão da cozinha, pode ter mais compaixão e aceitar que é o melhor que consegue fazer nesse momento. Um especialista em TCC pode ajudar a mudar os padrões de pensamento ensinando a interpretar este tipo de situações. 


Em 2020, uma revisão de investigação de 60 estudos feita pela Universidade do Utah, nos Estados Unidos, concluiu que a TCC e outras terapias corpo-mente podem reduzir o grau de dor nas pessoas que tomam opioides. Na maior parte dos estudos, o uso de opioides também diminuiu. 


Meditação e relaxamento 


A revisão de investigação da Universidade do Utah também descobriu que a

meditação de consciência plena está entre as formas mais eficazes de terapia corpo-mente para o alívio da dor. As práticas de relaxamento, como a meditação, podem minimizar a tensão, acalmar o sistema nervoso simpático e proporcionar uma maior sensação de controlo. As técnicas específicas – como o foco na respiração relaxando progressivamente diferentes músculos, ou visualizando um lugar calmo – podem demorar a aprender, por isso não esmoreça se não resultarem de início. 

Para algumas pessoas, a música, respiração profunda ou óleos essenciais podem ser relaxantes. O que é importante é encontrar aquilo que resulta para si. 


Massagem 


A massagem terapêutica pode aliviar a dor porque melhora a circulação e relaxa o corpo. Também pode reduzir a ansiedade que piora a dor. Alguma investigação sugere que pode ser eficaz nas lesões dos tecidos moles, dores de costas, dor de cabeça e fibromialgia. Procure um fisioterapeuta massagista qualificado que tenha formação específica para lidar com lesões. 


Acupunctura 


A acupunctura, derivada de uma prática chinesa com dois mil e quinhentos anos, pode tratar uma vasta gama de problemas comuns, incluindo dores nas costas ou de dentes. São inseridas minúsculas agulhas na pele até profundidades variáveis e pensa-se que interrompem a dor através da estimulação dos nervos. Os indícios variam, embora uma análise de 2017 publicada no The Journal of Pain tenha concluído que parecia ajudar determinadas pessoas para lá do efeito placebo. Normalmente são precisas algumas sessões para se verem os resultados e, tal como em muitos tratamentos, não é fácil prever quem irá beneficiar dela. 


Harriët Wittink, fisioterapeuta especializada em dor crónica e presidente do grupo de investigação de estilo de vida e saúde na Universidade de Ciências Aplicadas de Utrecht, nos Países Baixos, acredita que vale a pena tentar a acupunctura. «A frequência dos efeitos adversos é desconhecida e podem ser raros», diz. «Assegure-se apenas que o acupunturista é devidamente licenciado.» 


Canábis 


A canábis médica tem recebido mais atenção como potencial alívio para a dor embora a investigação ainda seja limitada, e ainda não é recomendada como tratamento de primeira linha. No entanto, o Imperial College de Londres estabeleceu um grupo de investigação da canábis medicinal para avaliar e desenvolver novos tratamentos com canabinoides (CBD) para a dor, inflamação e cancro. 


Entretanto, muitas pessoas têm experimentado por si. Uma análise de dados de saúde pública publicada o ano passado no The Lancet Regional Health-Europe concluiu que havia mais europeus a usar canábis em idades mais avançadas. Uma sondagem dinamarquesa de 2021 com pessoas que usavam canábis em vez de medicamentos com prescrição concluiu que o faziam sobretudo para gerir a dor. No entanto, fale com o seu médico antes de tentar a canábis. 


PREVENÇÃO DA DOR 


Miren Behaxeteguy, assistente social de 47 anos de Montpellier, em França, é um dos 41 milhões de europeus adultos que sofrem de enxaquecas. Podem ocorrer várias vezes por semana e deixá-la incapacitada. No início deste ano forçaram-na a uma baixa prolongada por doença. 

«Bati contra uma parede e decidi que tinha de gerir a dor de uma maneira diferente», diz Miren, que é avó. «Agora foco-me em estar confortável antes e durante um surto.» Assim que sente a dor a surgir coloca um gorro com compressas geladas e uma almofada quente no pescoço. Também recorre a outras técnicas de prevenção e gestão, como relaxamento e Pilates. 

A atividade física regular pode prevenir e aliviar as dores e moinhas de muitas maneiras. Melhora o bem-estar emocional, provoca a libertação de endorfinas e aumenta o fluxo sanguíneo e de nutrientes para as articulações e os tecidos. «O exercício não é apenas importante devido ao princípio “exercitar ou perder”, mas também porque 
aumenta a confiança na nossa capacidade de fazer as coisas», refere Harriët Wittink. 


Se se preocupa com o agravamento da dor ou em fazer pressão nas articulações, tente caminhadas ou exercícios de baixo impacto, como o tai-chi, ioga ou hidroginástica. E se recentemente teve uma lesão desportiva ou está a recuperar de uma cirurgia, um fisioterapeuta pode sugerir exercícios para fazer em casa que ajudam a recuperar ou a melhorar a mobilidade. 

Além dos exercícios que a fisioterapeuta lhe sugeriu e de ter aulas de Pilates, Miren faz exercícios de respiração profunda com a ajuda de vídeos on-line. «Demoram cinco minutos e, com o telemóvel, posso fazê-los em qualquer lado.» 


E também dá importância ao poder curativo dos animais de estimação. «Ir passear o meu cão ajuda-me a fazer exercício e a apanhar ar, e o ronronar do meu gato é incrivelmente calmante. Essa é a minha prescrição pessoal!» 


Lidar eficazmente com a dor com frequência pode implicar a exploração de uma variedade de estratégias. Aceite o conselho de quem passou por essa situação. «Tenha a mente aberta e tente coisas novas», aconselha Antony Chuter, do Reino Unido. «Faça uma lista de possíveis soluções e escolha uma. Se não resultar, escolha outra. Tem tudo que ver com o que é melhor para si. E é importante que aceite a dor e tire mais prazer daquilo de que gosta.» 



 







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